Tenho acompanhado com grande interesse a exibição da série portuguesa "Depois do Adeus". É um ambiente, uma história que me diz algo, e sobretudo diz a pessoas próximas de mim, como creio que diz a muitas famílias neste País. Trata-de de um momento marcante da vida democrática de Portugal, e que até aqui estava um pouco esquecido, encolhido num canto, como se houvesse medo, e até vergonha, de relembrar tudo o que então se passou. Saído de um longo período de obscurantismo, o País vibrou com a revolução de Abril e abriu-se, por completo, a novas perspectivas. A esperança morava no ar, e assim foi, pelo menos até Novembro de 1975. Neste cenário, cometeram-se muitos erros, e um deles foi a forma descuidada como se processou a saída de África e a integração dos portugueses que viviam nessas colónias. O sofrimento dos retornados está bem expresso na série da RTP1, mas pelo meio há muitas incongruências, alguma falta de imaginação e até certos equívocos que, expressos no ambiente também algo revolucionário que se vive nos nossos dias, podem gerar uma percepção errada sobre as mudanças que urge fazer. Porque é que será que na série o patrão da empresa é aquele homem inocente, bonzinho, que tem por único interesse manter a empresa a funcionar para o bem de todos? Porque razão os operários que querem tomar conta da empresa são retratados como anormais, insensatos, ignorantes, analfabetos, que nem se preocupam se a empresa pode fechar ou não? Porque é que, do outro lado dos retornados, estão os portugueses toscos, agressivos mas completamente burros, que apenas acham que os retornados estão ali para lhes roubar os empregos? Tudo isto me chega ao pensamento de todas as vezes que assisto à série. Por um lado, aprecio a iniciativa, porque percebo que algo do que está ali enriquece o meu conhecimento sobre aquele período da história do País; por outro lado, parece-me que tudo é visto de uma forma muito parcial, apenas de um lado, sem capacidade para abranger todas as vertentes, para perceber todos os comportamentos. E isto, de alguma forma, é adulterar um pouco a história. Por isso é tão importante ser cuidadoso quando se mexe com factos históricos; não pode ser assim, ao estilo de novela, com uma visão a preto e branco, com a mentalidade de quem ainda acredita que os comunistas comem criancinhas ao pequeno almoço...